Não ganhou Óscares, não vendia entradas e não tinha um nome fácil de pronunciar. Em resumo, Pete Postlethwaite tinha todas as condições para passar desapercebido na sua longeva carreira cinematográfica. Mas era um belissimo actor, uma ave-rara, cada vez mais perto da extinção. Um pássaro livre que exemplificava bem todas as virtudes que fizeram do "actor secundário", um elemento nuclear na equação de qualquer filme. São actores como ele que fazem os grandes maiores do que são muitas vezes. Poucos sabiam apreci-lo, muitos nunca o entenderão, mas mais do que qualquer estrela, actores como ele são insubstituiveis.
Quando um dia perguntaram a John Ford quem era o maior actor de Hollywood e este respondeu "Walter Brennan" poucos perceberam a magnitude da declaração do homem que fez do western uma arte. Brennan, veterano da era do cinema mudo, era a base fundamental de qualquer filme de Hollywood. Era o eterno "secundário". o homem em quem os realizadores confiavam para trazer humor, drama, emoção e vida a qualquer filme. A estrela, o protagonista, tinha de comportar-se como tal. Para a plateia. Mas o secundário podia brilhar e fazer do filme seu, não tinha amarras mediáticas que o segurassem. Brennan foi, durante 30 anos, o mais genial dos secundários de Hollywood. Abriu uma escola de nomes nucleares na evolução cinematográfica de Hollywood. Para casa Brando havia um Malden, para cada Stewart um Mitchel, para cada Newman um Kennedy, para cada Lemmon um Mathau. Essa velha estirpe, dos homens sem glória, sem direito ao nome por cima do cartaz, foi definhando à medida que o tempo decidiu que todos tinham direito aos seus 15 minutos de fama. Hoje o secundário, como tal se entende, é uma raça em extinção. Porque todos querem ser protagonistas.
Essa malaise não afectou nunca o britânico Pete Postlhwaite. E talvez por isso ele foi imenso no seu mester, na sua área. Fez brilhar Daniel Day-Lewis em In the Name of the Father, ofrecendo o contra-ponto perfeito ao over-acting extremo do magnifico actor inglês. O mesmo se pode dizer aos seus desempenhos em Amistad, Usual Suspects, Dragon Heart ou os mais recentes Inception e The Town, os seus dois últimos projectos. Fez do contra-ponto a sua arte e exprimiu-a até ao tutano. A sua figura franzina e recta impunha um misto de respeito reverencial e carinho intranhável que lembrava bem essa escola dos actores bigger than life das penumbras.
O actor de 64 anos falecido vitima de um cancro não foi um actor precoce. Só começou a aparecer regularmente em projectos cinematográficos na década de 80, pontualizando algumas participações televisivas, que em Inglaterra é sempre um degrau fundamental, salvo se se é um mestre shakesperiano. Postlethwaite não o era - apesar do sucesso do seu Rei Lear no ano passado nos palcos de Liverpool - e por isso ganhou a pulso um lugar na lista dos actores anónimos mais cotados dos dois lados do Altântico. Spielberg, que o dirigiu em Lost World e Amistad, votou-lhe o mesmo elogio que Ford a Brennan, entendendo bem a mecanica da interpretação do mago do Cheschire.
Mas na única vez em que foi protagonista, Postlethwaite demonstrou que o saber não tem limites. Foi em Brassed Off, filme fundamental da filmografia social britânica da década de 90 e que ajudou a redefinir a politica social com as cidades industriais destroçadas pela politica economica dos governos conservadores de Tatcher e Major. Uma pequena localidade, como tantas outras, onde o desemprego floresce e em que uma banda musical local é a única ilusão que sobrevive. Banda onde milita, claro, o virtuoso Pete, um homem de principios como poucos que lançou a tónica para um revisitar do passado industrial inglês e onde começou também a sua campanha como activista. Marchou contra guerras, lutou em prole do meio ambiente e defendeu as politicas sociais do New Labour com unhas e dentes. Foi figura dentro e fora do grande ecrã. Como sempre, sem vender capas de jornais, também essa sua labor passou desapercebida ao lado dos milhões de Clooney e companhia. Nesse filme despontava um jovem Ewan McGregor, mas todos ficaram encandilados com o grito social de um actor que muitos admiravam e poucos conheciam.
Já minado pela doença, a carreira de Postlethwaite foi sofrendo com o passar dos anos as agruras da vida. A sua morte, precoce tendo em conta o quanto ainda se podia esperar de um espirito irrequieto como ele, é também o prenuncio de uma era dificil para os cineastas e cinéfilos que buscam sempre na sombra aquela imagem de raiva, dor, ódio, conforto e esperança que actores anónimos e que vivem longe dos holofotes são capazes de propocionar. Postlethwaite era de outra raça, uma escola imemorial. Com ele, como com qualquer outro grande, fica a lenda, as imagens e os momentos que o celuloide capta para a eternidade, onde tudo é permitido e nada acontece por acaso.
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